Uma Casa de Custódia, prevista para ser construída em uma região de expressiva expansão imobiliária que poderíamos chamar de Tríplice Limite, provoca revolta e une na batalha jurídica de resistência bairros populares e condomínios de alto padrão. A região envolve áreas de três municípios – Maringá, Sarandi e Marialva – e está diante de um projeto com potencial de impactar negativamente a valorização dos imóveis ao seu entorno e escalar a sensação de insegurança. São pelo menos seis as comunidades que se uniram contra um projeto da Prefeitura de Sarandi e do Departamento de Polícia Penal do Estado do Paraná (Deppen).
A aliança é composta por proprietários de imóveis e moradores do Jardim França, onde predominam casas geminadas; do Distrito Vale Azul, bairro de pequenas chácaras; e dos condomínios de alto padrão Green Park e Ecovalley Residence, os quatro em Sarandi; do Parque das Águas, em Marialva; e do Ecogarden Residence, em Maringá, que se mobilizam para impedir a concretização da obra. As divisas municipais na região são mesmo atípicas, como disse uma moradora do Ecogarden: “A portaria do meu condomínio tem endereço em Maringá, mas eu pago o IPTU da minha casa para Sarandi”.
O Ministério Público de Sarandi já moveu uma ação judicial para anular o decreto municipal que desapropriou a área de 20 mil m² para a construção da Casa de Custódia. Inicialmente foi negada em primeira instância, decisão essa que foi ratificada pelo Tribunal de Justiça do Paraná, segundo informou a Prefeitura de Sarandi na quinta-feira passada. “A decisão judicial (do TJ) reconheceu que o Município atendeu aos requisitos legais necessários”, afirmou a prefeitura ao ser procurada pela reportagem – a integra da nota está no final da matéria.
Mas a decisão não deve cessar a disputa jurídica. Por conta própria, os moradores e proprietários de imóveis da Tríplice Divisa pretendem recorrer ao Judiciário mais uma vez. Uma reunião entre a direção da Associação de Moradores do Jardim França e do Vale Azul e os moradores do Condomínio Ecogarden aprovou um aporte financeiro de R$ 50 mil à causa. Os recursos serão usados para custear os honorários advocatícios, laudos e documentação necessária.
Conforme a ata da reunião – que a reportagem teve acesso-, o custo total da ação, incluindo honorários advocatícios, laudos e documentações necessárias, foi estimado em R$ 85 mil. A parte do Ecogarden será dividida entre todos os proprietários do residencial em parcelas mensais e os R$ 35 mil restantes ficará por conta da Associação de Moradores do Jardim França e do Vale Azul.
Faltou EIV à Casa de Custódia
O advogado Fernando Vicentin, que esteve presente à reunião, apontou falhas técnicas no processo de desapropriação. Uma delas seria, conforme questionou, o baixo preço pago na desapropriação da área. O Município pagou R$ 2.080.000,00 por 20 mil m². Ou seja, R$ 104,00 por m². Segundo um antigo morador do Vale Azul, no começo deste ano “uma provedora de internet comprou um lote de mil metros quadrados na esquina das ruas Minas Gerais com Guanabara por R$ 280 mil, já murado”. Ou seja, pagou R$ 280,00 por m². “Mas já tem gente pedindo R$ 350 mil”, acrescentou.
Outra possível falha, segundo o advogado expôs na reunião, foi não ter sido realizado o Relatório de Impacto de Vizinhança e Audiências Públicas. Isso, conforme a legislação, deveria ter sido realizado pelo Município antes da desapropriação, para ter conhecimento se a área efetivamente serviria para o objetivo proposto. No entanto, na nota enviada pela Prefeitura na quinta-feira, 30, ela afirma que a audiência pública e os estudos técnicos necessários foram realizados.
O fato de a área desapropriada ficar a menos de 1,5 mil metros de um aterro sanitário, distância mínima legal, também segundo Vicentin, seria outro impedimento legal previsto na legislação ambiental. Foi mencionada ainda a inexistência de estrutura básica nos arredores, como escola, creche e posto de saúde, “elementos que, curiosamente, constam de forma positiva no laudo técnico encomendado pelo Município”, acrescentou o advogado.
Ele esclareceu que a ação popular será proposta contra o Município de Sarandi, pela desapropriação irregular do imóvel, e contra o Estado do Paraná (por meio do DEPPEN), responsável pela tentativa de construção da Casa de Custódia, buscando-se, por via judicial, a reversão da desapropriação e o impedimento da obra por falta de laudos . Já a ação proposta pelo Ministério Público foi apenas contra o Município.
Síndicos de outros dois condomínios da região ouvidos pela reportagem – que pediram para não serem identificados – observaram que “ter como vizinhos de muro presos custodiados gera uma grande sensação de insegurança”. Segundo eles, “particularmente as comunidade do Jardim França e do Distrito Vale Azul precisam mais de infraestrutura e equipamentos públicos do que uma Casa de Custódia”. Um deles disse que os moradores do condomínio não pretendem fazer manifestações públicas, “e sim lutar na Justiça”.
TJ reitera decisão de primeira instância
Procurada para falar sobre o caso, por meio de nota a Prefeitura de Sarandi informou que “o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, manteve a decisão da primeira instância em decisão do desembargador Coimbra de Moura, da 4ª Câmara Cível, e negou o pedido de efeito suspensivo requerido pelo Ministério Público Estadual que pedia a paralisação do processo de construção da Casa de Custódia nas proximidades do Jardim França.
Com isso, fica mantida a decisão de primeira instância, que considerou legal o decreto de desapropriação do terreno, autorizando o início das obras.
A decisão judicial reconheceu que o Município atendeu aos requisitos legais necessários, incluindo estudo de impacto orçamentário-financeiro, análise de infraestrutura urbana e acessibilidade, além da localização estratégica do imóvel, adequada ao planejamento técnico do projeto.
Lembrando que o município já efetuou o depósito dos valores e está aguardando apenas a perícia judicial.
O Município reforça que atua em conformidade com a legislação e que o processo de desapropriação segue respaldado pelo interesse público, observando os princípios da legalidade, transparência e eficiência administrativa.
Em relação à posse do terreno, o Município segue cumprindo os trâmites legais para formalização da transferência ao Governo do Estado do Paraná, responsável pela execução da obra.
A Prefeitura de Sarandi reitera seu compromisso com a população e destaca que todas as etapas do projeto estão sendo conduzidas dentro da legalidade e sob acompanhamento técnico e jurídico”.
A assessoria de imprensa do Governo do Estado também foi procurada e retornou dizendo que acdemanda foi passada para a Secretaria de Segurança Pública do Paraná, à qual o Departamento de Polícia Penal (Deppen) está ligado, mas não houve nenhum novo retorno, que será publicado tão logo seja enviado.
O que é uma Casa de Custódia
Uma Casa de Custódia é uma instituição responsável por abrigar e custodiar pessoas adultas que foram detidas pela prática de crimes, enquanto aguardam julgamento ou cumprimento de pena. GMConline
